A estudante
Dayane de Sousa Pereira Silva e a professora Valkíria Muniz Ferreira, de Picuí
(PB), estão entre os 20 vencedores nacionais da Olimpíada de Língua Portuguesa
Escrevendo o Futuro, cuja final foi realizada hoje em Brasília.
O texto
da aluna, que foi vencedora na categoria Memórias Literárias, concorreu com
outros 13.849 inscritos na Olimpíada. Ao todo, mais de três milhões de
estudantes participaram desta edição.
A
Olimpíada é desenvolvida pelo Ministério da Educação (MEC) e pela Fundação Itaú
Social, sob a coordenação técnica do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação,
Cultura e Ação Comunitária (Cenpec). O programa, que este ano alcançou 5.014
municípios brasileiros, busca aprimorar a prática dos professores em sala de
aula para o ensino de leitura e escrita em escolas públicas.
Participaram
alunos de 5º, 6º, 7º, 8º e 9º anos do Ensino Fundamental e 1º, 2º e 3º anos do
Ensino Médio. Os alunos de 5º e 6º anos no gênero Poema, os de 7º e 8º anos
desenvolvem textos do gênero Memórias Literárias, 9º ano do ensino Fundamental
e 1º ano do Ensino Médio trabalham o gênero Crônica. Os alunos do 2º e 3º anos
do Ensino Médio produzem Artigos de Opinião. Em 2014, foram realizadas cinco
etapas de triagem: escolar, municipal, estadual, regional e, finalmente, a
nacional.
Durante
o ano, os professores das escolas participantes passaram por um processo
intenso de formação. Para realizar as atividades em sala de aula, as escolas
públicas de todo o país receberam a Coleção da Olimpíada, material de apoio no
ensino da escrita de diferentes gêneros textuais, utilizado com os alunos no
horário regular de aulas. A Olimpíada tem como tema O Lugar Onde Vivo, que
proporciona aos estudantes uma reflexão sobre sua própria realidade.
Premiação:
Os 20 vencedores nacionais, professores e alunos, receberão medalhas de ouro,
um notebook e uma impressora. As escolas nas quais lecionam/estudam os
selecionados também serão contempladas com laboratórios de informática,
compostos por dez microcomputadores e uma impressora, além de um projetor
multimídia, um telão para projeção e livros.
Confira
o texto da estudante Dayane de Sousa Pereira Silva de Picuí (PB)
Memórias de uma maldita
Aluna:
Dayane de Sousa Pereira Silva
Categoria:
Memórias Literárias
Quando eu era criança, minha
netinha, a vida era outra. Este lugar era muito diferente. Outra vida, outros
costumes.
Ainda criança, ia poucas vezes à
cidade. Naquele tempo, nós ficávamos em casa, esperando papai voltar da feira,
trazendo um saquinho com umas dez balinhas de mel ou um pão-doce, cheio de coco
em cima. Era a nossa festa semanal!
Eu morava num paraíso, chamado
Sítio Mendes, onde a paz reinava e o sol brilhava alegre. Poluição e violência?
Ali não havia... Ah! Como era bom brincar com meus cinco irmãos correndo no
meio do roçado!
A gente brincava de roda,
ciranda, bonecas de sabugo de milho, boi de osso...
Mas felicidade de verdade tivemos
no dia em que papai, voltando da feira, nos trouxe uma bicicleta Monark,
vermelha, herdada de minha tia. Mesmo sendo usada, mesmo sendo uma só para
seis, foi a maior alegria! Ela precisava de alguns consertos. De tanto
insistirmos, meu pai foi consertá-la e ainda a inauguramos naquela noite,
contando apenas com o clarão da lua...
Nós éramos uma família grande,
unida e muito feliz, pois tínhamos uma terra fértil cheia de frutas e verduras
brotando por toda parte, água jorrando limpinha nos barreiros e o gado gordo
nos currais. Só que essa grande felicidade acabou de repente. Tudo começou a
mudar, aquele mundo verde começou a sumir, a água nos barreiros começou a
faltar.
Nessa fase, uma grande seca
assolava nosso município e passamos por muitas dificuldades. Quando papai e
vovô chegavam com os pedaços de xiquexique, facheiro e macambira, era preciso
assá-los para saciar a fome das poucas reses que ainda nos restavam. Dava até
pena ver as bichinhas, olhinhos pidões, e depois observá-las mascando aquela
comida improvisada, ainda quente. Tanto que escorregava um líquido viscoso de
seus olhos, como se chorassem.
Que cena horrível comecei a
presenciar, o gado magro morrendo! Tudo seco, sorriso no rosto não havia, pois
a comida era tão pouca... Tivemos que nos unir para poder afastar os fantasmas
daquela grande seca. Ainda assim, alguns moradores partiram para outras regiões
do país em busca de uma vida melhor. Nossa! Tivemos que vender tudo, nossa
casa, nosso chão, nossa bicicletinha!
Minha família decidiu permanecer
ainda no local. Apenas nos mudamos para a zona urbana. Foi tão triste ver meus
pais sofrendo e, no final, termos que sair de onde amávamos!
Viemos morar numa pequena casa de
taipa – feita de barro, coberta de palha, e porta improvisada com pendões. A
minha família permaneceu toda amontoada naquela casinha. Não tínhamos mais
nossos brinquedos, nossa liberdade. Entretanto, ainda carregava na lembrança a
imagem da nossa bicicleta, tão querida. Tivemos que deixá-la para trás, junto
com todos os bons momentos que passamos lá no velho Sítio Mendes, celeiro de
nossa infância.
E assim vivíamos na esperança de
um dia a chuva voltar e, com ela, a nossa felicidade. Não voltamos mais a morar
na zona rural. E, hoje, mesmo sem meus pais e meus irmãos, que foram cada um
para um lado, só me resta contar aos meus netinhos, as histórias daquela
maldita seca que levou minha felicidade e transformou nossa realidade.
(Texto baseado na entrevista
feita com a senhora Maria Valdenora de Sousa, 63 anos.)
Fonte: Internet